O clássico "Burguesia" foi lançado no álbum homônimo de 1989, o último gravado por Cazuza em vida. Composta em parceria com George Israel e Ezequiel Neves, a canção é uma crítica social que aborda o comportamento e os valores da elite econômica brasileira, com ênfase na desigualdade e a alienação de classes mais privilegiadas – que Cazuza ironicamente fazia parte.
A faixa começa com versos diretos, como "A burguesia fede, a burguesia quer ficar rica", que sintetizam a insatisfação de Cazuza com a classe dominante. Segundo análise do site Letras.Mus, o cantor denuncia a alienação dessa elite, apontando comportamentos arrogantes e apáticos. Ao mesmo tempo, o cantor reconhece sua própria posição social, ao dizer:
"Pobre de mim que vim do seio da burguesia. / Sou rico, mas não sou mesquinho. / Eu também cheiro mal, eu também cheiro mal."
Esse trecho expõe a ambiguidade da crítica, com uma autocrítica explícita à sua condição de alguém que também pertenceu a um meio privilegiado. Vale lembrar que o roqueiro era de classe alta e morava na Zona Sul do Rio de Janeiro, sendo filho de executivo de gravadora.
Já para o site Culturaliza BH, a música vai além de atacar os excessos da classe abastada e critica a indiferença em relação às desigualdades. Trechos como "Enquanto houver burguesia, não vai haver poesia" refletem a visão do cantor de que o materialismo exacerbado sufoca valores mais humanistas.
Em análise acadêmica, o artigo "A burguesia fede: uma análise da formação discursiva na canção de Cazuza", de Hudson Marques da Silva e outros, associa a letra a uma perspectiva marxista. Segundo os autores, o desejo da burguesia de "ficar rica" reflete a acumulação de bens e capital, incompatível com a construção de uma sociedade harmônica. A ideia de "poesia" é interpretada como uma metáfora para coesão social e justiça, o que estaria ameaçado pela busca incessante de lucro.
Ainda de acordo com o estudo, a música também faz críticas ao contexto político da época. Parte da burguesia, segundo a visão de muitos, teria apoiado ou financiado o regime militar, perpetuando desigualdades e retrocessos sociais. A canção, portanto, combina análise econômica e histórica em um discurso crítico e abrangente.
Cazuza e as críticas à música "Burguesia"
Apesar de ser considerada uma das composições mais emblemáticas de Cazuza, Burguesia também foi alvo de críticas, tanto por seu conteúdo quanto pela forma como o recado foi transmitido. Em entrevista ao canal Corredor 5, o escritor Luiz Felipe Carneiro comentou que, em sua visão, o cantor poderia ter abordado o tema de maneira mais elaborada.
"É uma letra pueril e meio boba até, para o padrão Cazuza. Ele poderia ter dado aquele recado de outra forma", afirmou. O escritor relatou, ainda, sua experiência inicial com o álbum: "Lembro que estava comprando a trilha sonora da Rainha da Sucata na Lojas Americanas e aí a caixa botou dentro do saco uma fita do Burguesia. Eu falei que não era minha, mas ela disse para eu levar. Nunca escutava aquela fita inteira. Só fui prestar atenção e gostar depois quando tive em CD."
O apresentador Clemente Magalhães também expressou sua insatisfação com a faixa, classificando-a como a pior do disco. "Não gosto daquele vocal, até hoje acho a letra meio equivocada. Se o Dinho Ouro Preto tivesse feito, acharíamos maneiro, mas se esperava muito do Cazuza depois de ‘Ideologia’ e ‘Brasil’, por exemplo."
Pesquisa, Redação e Edição: Carlos Martins
Por Gustavo Maiato
Fonte: Portal | Revista Whiplash
Foto/Imagem: Reprodução